ASSIM FALOU BENEDITO
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Como existe gente mal
educada, me virei pronta para mandar a pessoa para... Era ela.
Já não sabia mais o que
dizer. Apenas me prendi naquele olhar marrom.
“Onde está o corrimão?” -
Procurei, mas encontrei o vazio. Alguns segundos se passaram entre o início e o
fim daquele diálogo intenso... Sem palavras.
Consegui dizer, tentando mostrar minha indignação:
- Basta pedir licença, eu
saio.
As palavras quase não
saíram, foram suaves e baixas, nem sei se ela ouviu. Dei espaço e meu olhar
desviou-se dos olhos. Outra parte dela prendeu minha atenção. Vi seus lábios se
moverem, num tom firme:
- Obrigada.
E, passou... Apressada,
para o lado oposto, novamente.
Sem demora, Edgar
encostou ao meu lado, me trazendo novamente para o teatro e enquanto
retornávamos aos nossos lugares, foi dizendo:
- Encontrei o Miguel,
está com a Andréa, e a Rita e a nova namorada. - Sentamos e ele continuou: - Ela
encontrou uma camiseta com marcas de batom vermelho e nenhuma delas usa,
então...
Interrompi:
- Como você sabe? - Falei
sem paciência.
- Ele contou que o
Augusto, que é irmão da Silvia, namorada da...
- Para! Para! Para! Deixa
de ser fofoqueiro Edgar!
Ele me olhou com espanto:
- Você perguntou.
- Achei que tava falando
com o Benedito e ele nunca me responde.
O olhar sério dele se
transformou, e caiu na risada. Eu também.
Em seguida as luzes se apagaram
e o espetáculo teve início. Como eu já previa, foi maravilhoso. A produção
fantástica, estava inebriada com a performance dos atores, mas de vez em quando
surgia em minha mente aquele olhar marrom, tão rápido, porém intenso. Intrigou-me
aquela mulher que passava por mim, sempre com pressa, mas que por alguns
momentos estacionou em meus olhos... Como eu nos dela. Nunca fiz o tipo
caçadora, nunca tomei a iniciativa. Sempre escolhi e esperei que elas agissem,
mas desta vez senti vontade de dizer: - “Você é linda!” - e tomá-la pela mão: -
“Vem comigo...”
Mas não fiz, tampouco
tive tempo para isso, estava absorta nos pensamentos, quando Egdar sussurrou
próximo ao meu ouvido:
- Percebeu a luz?
Consegue nos envolver na cena... Perfeita!
Suspirei... E retornei.
- É... Consegue...
O espetáculo terminou, e depois
de muitos aplausos saímos em direção ao café. Conseguimos chegar mais rápido
desta vez, já que a maioria das pessoas dirigia-se para as saídas, liberando
assim a escada para o café.
Encontramos Miguel e as
meninas, combinamos esticar a noite, uma vez que ninguém trabalharia no outro
dia...
- Primeiro jantar, depois
boate! - Exclamou Rita, tentando nos convencer.
Todos concordamos. Durante
o jantar, colocamos as informações em dia, sobre trabalho, amores... Deles, uma
vez que eu não tinha o hábito de falar nada sobre minha vida pessoal. Mas mesmo
assim, eles tentavam arrancar as informações. Miguel foi direto:
- E tu, Farah... Com a
Marina?
Olhei para ele com cara
de espanto:
- Quê?
A resposta foi de Rita:
- Ah, Farah! Você esconde
o jogo, todo mundo sabe que ela é louca por você e que de vez em quando vocês
ficam.
Olhei para ela e meu
olhar foi frio, assim como minha resposta:
- Se todo mundo sabe, não
preciso contar nada.
Edgar me salvou:
- Vamos?
Edgar e eu chegamos antes
e ficamos esperando Miguel e as meninas na frente da boate. Assim que chegaram
nos dirigimos à entrada. Antes de entrar Edgar anunciou:
- Vão indo, vou fumar.
E dirigiu-se para a
lateral da porta. Meus olhos acompanharam e pararam...
Novamente. Ela...
Encostada na parede, fumando.
Porém, desta vez meu
olhar foi rápido, apenas o suficiente pra vê-la. Minha auto preservação, às
vezes exagerada, assumiu o controle.
Entrei na boate com a
sensação de que a noite seria ótima.
***
Sinceramente?
Ninguém naquela boate me
interessava. Na verdade, parecia que ninguém mais, no mundo inteiro.
Talvez eu estivesse ficando
velha.
Ou doente, ou cansada, ou
soterrada de forma inexorável por tantas e inúmeras frustrações e insatisfações
passadas.
No entanto, dois copos de
vodka bastaram. Para minha mente estagnar, enguiçada numa única imagem: a da
mulher dos olhos de safira na escada.
Sacudi a cabeça,
irritada, tentando afastá-la.
Nada.
Inútil mesmo.
Resolvi então avisar aos meninos
que ia fumar do lado de fora. Abri a porta e me senti não em Porto Alegre, mas
no Ártico.
"Que cidade fria do
caralho!"
Avisei pro door sentindo
meu corpo todo congelar:
- Eu vou só fumar um
cigarro, tá?
Fiquei tragando ali mesmo
na calçada. Próxima ao concreto que apesar de frio, me protegia um pouco da
corrente de ar absolutamente gélida. Umedecendo os lábios pra eles não colarem
no cigarro. Os dedos meio dormentes, me fazendo entender o real significado da
palavra “enrijecidos”.
"Puta merda!"
Foi quando um grupinho de
pessoas se aproximou. Entre eles... Ela.
Seria uma miragem?
Nossos olhos se cruzaram
antes que a loira enigmática entrasse. Ou melhor: eu a olhei. O olhar azul se
projetou através de mim, me transpondo como se eu fosse nada.
Aquilo aumentou o meu
interesse, me deixou com mais vontade. Despertou meu instinto de predadora inteiramente,
me deixou pronta para a caça.
A sorte - ou o azar, quem
sabe? - Parecia estar do meu lado. Porque um dos amigos dela ficou para trás,
dizendo:
- Preciso fumar um
cigarro antes de entrar.
Encostou-se no muro ao
meu lado, acendeu um cigarro. Olhei para ele de cima a baixo. Um tipo baixinho,
simpático. Daqueles gays que não chamam atenção nem fazem sucesso na boate e que
é sempre o amigo dos cobiçados. Exatamente o contrário da loira indiscutivelmente
hipnótica. Puxei assunto:
- Seus amigos não fumam?
Ele me olhou desconfiado
e respondeu como quem não quer papo:
- Não.
Insisti, tentando ser
simpática:
- Você vem sempre aqui?
Ele arregalou os olhos.
Parecendo assustado. E declarou, muito sem jeito:
- Eu sou gay, tá?
Traguei. Ele fez o mesmo.
Falei no mesmo tom que ele havia usado:
- E eu sou lésbica, tá?
Foi mútuo, como se
tivéssemos combinado: nos olhamos, e caímos na gargalhada.
Aproveitei a pausa que se
estabeleceu depois – e a recém adquirida intimidade – para finalmente pedir,
após uma última tragada, o que eu muito temia, mas ao mesmo tempo tanto desejava:
- Me apresenta a sua
amiga?
Segui o baixinho pela
pista de dança, abrindo caminho entre as pessoas. Até ele parar na frente de
uma mulher linda, mas que não era ela, infelizmente:
- Andréa, essa é a Ana
Clara. Ana Clara, Andréa.
A mulher me olhou, e
sorriu, parecendo agradavelmente surpresa. Cumprimentei-a, e me desvencilhei
rapidamente:
- Com licença.
Quase correndo atrás do
meu cupido atrapalhado:
- Ei! Espera! Só um
momento!
Ele me olhou, espantado. Fui
obrigada a dizer:
- É que... Não é essa. -
Completei rapidamente: - A loira.
A expressão dele foi
indecifrável. Deixou escapar um enfático:
- Capaz!
E completou com algo que me
fez sorrir:
- A loira então. Mas já
vou avisando: por tua conta e risco!
***
O primeiro gole do
conhaque desceu queimando. Assim que soltei o copo na mesa, ouvi Edgar chamar
meu nome. Virei-me sorrindo. Não imaginava que ela estaria ao lado dele. Fiquei
sem ação, muda, paralisada... Novamente nossos olhares se encontraram, mas por
pouco tempo. Olhei para ele esperando uma palavra que me elucidasse tal cena.
- Farah, esta é Ana Clara.
Ana Clara, esta é a Farah. Pronto! Devidamente apresentadas.
Ficou em silêncio, eu não
disse nada e ela, tampouco. Apenas os olhares, uma na outra. Edgar falou
novamente:
-Bem... Já fiz minha
parte, agora é com vocês.
Silêncio. Suspirou. Falou
de novo:
- Pelo menos digam: “Oi,
tudo bem?”
Nada. Nem ela nem eu.
Então foi ele, novamente:
- Nossa... Acho que a
conversa tá ótima, mas vou ali... Já volto.
Esperou Falou de novo:
- Não vão sentir minha
falta mesmo...
E saiu. Nos deixando
paradas, uma de frente para outra, sem ação. Falamos juntas:
- Oi...
Rimos...
***
Rimos...
Depois nos olhamos. O
silêncio permaneceu. Palavras para quê? Mesmo se eu quisesse, não tinha porque,
muito menos o que dizer.
Não conseguia pensar.
Apenas desejar...
O olhar azul criando um
campo de energia que atraía o meu. Aproximei o rosto lentamente. Ela também.
Numa sincronia perfeita.
Nossas bocas se
encontraram, se provaram... Estranha sensação de... Como se nossos lábios já se
conhecessem. Suspiramos. Juntas novamente.
Ela entreabriu os lábios,
num convite implícito para que eu aprofundasse o beijo. Então... Impossível
descrever aquele momento absolutamente intenso, quando perdi o chão, a razão,
toda e qualquer impressão além da língua enroscada na minha, me deixando em
suspenso.
Puxei-a pela cintura.
Senti as mãos dela em meu pescoço, me acariciando a nuca... Alguns gemidos
sufocados. Meus? Dela? Já não sabia distinguir...
Quanto tempo ficamos
daquele jeito? Saboreando aquela ânsia adocicada, molhada, arrebatadora? Perdi a
noção completamente...
***
Ela estava ali, parada
na minha frente, sorrindo... As duas mãos no bolso do casaco, me olhando.
Embora estivéssemos a poucos centímetros uma da outra, a distância entre nós
era imensa, diante da minha vontade...
Meu olhar pediu, ela
atendeu. Percebi seus lábios se aproximarem... Fechei os olhos... Suaves,
doces, a minha respiração foi um pedido, imediatamente sua boca me devorou num
beijo delicioso, puxou-me pela cintura, minhas mãos encontraram sua nuca, os
sons abafados da aprovação recíproca incentivavam a entrega absoluta. Fiz da
minha língua instrumento de reconhecimento, ela se deixou conhecer docemente...
Estávamos apresentadas.
***
Um leve cutucão no braço
me trouxe de volta. Com pesar me afastei da boca da loira, mas não a soltei.
Continuamos coladas, e viramos juntas para ver quem era a pessoa totalmente
inconveniente. Murilo, o cenógrafo do espetáculo. Muito sem graça depois do
olhar com que o fuzilei:
- Desculpa, Ana, mas...
Nós já vamos e... Só vim perguntar se... Você vem com a gente?
Respirei fundo, engoli a irritação,
e respondi educadamente:
- Não.
Murilo assentiu com a
cabeça, se despediu e desapareceu.
Voltamos a nos beijar. De
um jeito totalmente diferente. Como se a interrupção tivesse tornado tudo mais
urgente.
Passei as mãos pelo corpo
dela, apertando-a com força, colando-a mais a mim. Ela apenas gemeu. Ofereceu-se,
numa aceitação plena.
Desci minha boca pelo
pescoço incrivelmente atraente, sentindo ela se arrepiar tanto quanto eu. Naquele
momento, já não conseguia pensar. Dominada por uma explosiva mistura de
afobação, álcool e desejo, acabei aproximando meus lábios do ouvido da loira e
sussurrando:
- Vamos pra outro lugar?
Quero passar a noite com você...
Ela se afastou um pouco.
Sussurrou de volta, num tom de voz que me fez perceber imediatamente o tamanho
da minha besteira:
- Acha que é assim? Está
pensando o quê?
Os olhos azuis me fitaram
com uma superioridade glacial. Dentro deles, pude ler perfeitamente: decepção, ofensa,
surpresa, e... Havia algo mais... Algo
que não consegui definir direito, pois não tive tempo.
Com um tom de voz
absolutamente sarcástico, de profundo desprezo, ela mesma respondeu:
- Eu não sou um copo
descartável.
Aquilo me pegou de
surpresa. Fiquei alguns segundos fitando-a, atônita, sem acreditar... Até que a
percepção finalmente veio.
- Direta demais pra você,
gata? Desculpa, mas... Pra que dar voltas? Nós duas sabemos onde isso vai
terminar, não é mesmo?
***
- Que raciocínio tão
fantástico o teu... Concluiu isso baseado em algo além do seu ego gigantesco? -
Falei indignada pelas palavras dela.
- Não, gata... Concluí
pelo jeito que você se esfregou em mim, mas... Talvez prefira fingir que não
quer... Se fazer de difícil... Coisa que, como já vimos, você está longe de ser...
- Tu não me conhece
pra dizer como eu sou.
- Acabou de se
apresentar...
E o sorriso irônico
dela me deixou mais indignada, ataquei:
- Ah e tu é muito
nobre... Tri educada.
Ela começou a rir... E
as palavras saíram no meio da risada:
- Melhor tri do que
bi, gata...
E continuou rindo... Meu
sangue ferveu, olhei para ela furiosa...
- Vai à merda! E vê se
para de chiar!
Saí como um tornado em
direção a Edgar, parei ao lado dele que segurava um copo e olhava em direção a
um loiro encostado no bar.
- Me leva embora!
- Nossa, que houve
contigo?
- Nada Edgar, quero ir
pra casa... Se tu não vai eu pego um táxi.
- Não, te levo... Vem.
CONTINUA...
postado originalmente em 27 de Agosto de 2013 às 18:00
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